É comum nesta época do ano começarmos a fazer o balanço do ano cessante e a sonharmos com o ano que se inicia. Chegamos ao ponto de atribuir prémios ou distinções a personalidades que marcaram o ano e a estimar através de uma ciência que desconheço, o seu futuro e o trajecto que farão. Mas e as questões de fundo? Nunca as enunciamos ou esboçamos em sonho. Nunca paramos para pensar nos hábitos ou raízes de fundo que nos afectam e que podemos ainda mudar ou melhorar!
Provavelmente se eu fosse da área das finanças, estava contente por se ter cumprido o limite do défice e iria desejar que em 2005 se conseguisse novamente. Mas de que servia a longo prazo?
Pensemos. È logicamente importante assegurar que os 3% impostos pela União Europeia sejam cumpridos, de modo a que os fundos comunitários e os benefícios não sejam cortados. Nesse sentido é extraordinária a preocupação em corresponder com os compromissos assumidos, mostrando assim responsabilidade, rigor e seriedade. Mas não seria, numa perspectiva de fundo, desejável ter antes 0% de défice ou até um ano superavit, isto é, com lucro? É que 3% do PIB como prejuízo é demasiado e nenhuma carteira aguenta anos disto! Será que não enraizámos demasiado a cota ou percentagem colocada por Bruxelas? Não está já na altura de pensarmos em realizar lucro ou pelo menos em pagar as despesas?
Entre aqueles que não cumprem e os que cumprem a meta dos 3%, prefiro os cumpridores. Mas dentro dos cumpridores, prefiro aqueles que não geram qualquer défice! Mesmo que para isso as medidas a tomar sejam extremamente impopulares…é o futuro que está em causa!
No fundo o que apenas pretendo transmitir é que em 2005 os desejos assentem em algo palpável, prometedor e real, nem que para isso se transplantem raízes, mudem mentalidades ou morram velhos hábitos!
Por exemplo, de que serve dissimular a nossa indignação perante determinados prestadores de serviços que pertencem à economia paralela e praticam preços inflacionados, só porque são difíceis de encontrar, têm pouca disponibilidade e o seu trabalho é-nos extremamente precioso? Porque não exigimos em 2005 que passe a existir de forma palpável e real, uma tabela de preços para prestadores de pequenos serviços pontuais aos quais já nos habituámos a pagar demasiado e sem factura ou recibo em troca? Parar de alimentar a economia paralela deverá começar por nós, exigindo através de um pequeno gesto de pedido de factura, que esta ameaça à sustentabilidade termine! Lamentável é que, quando Bagão Félix referiu tal ideia, tenha sido considerado um ponto alto de humor! Falo de 22% do PIB que têm de ver os seus dias contados, para que se fale de um futuro que não esteja assente em artifícios deste género!
Um futuro que não esteja edificado, tal castelo em risco de desmoronamento, como aconteceu aquando do aumento de milhares de trabalhadores na função pública que se deu de Mário Soares a Guterres passando por Cavaco Silva. Quando não se justifica tal medida e não se verifica melhorias de serviços, de que serve aumentar as despesas públicas e a máquina do estado? Serve propósitos eleitorais?
Mais tarde ou mais cedo terá de ser encarada a realidade e quanto mais tarde, mais dura ela será!
Outro costume instituído mas que tem de ser revisto ou deveria ser actualizado, está relacionado com a “livre circulação europeia”. É um termo e um desígnio que compreendo e estímulo, mas deveria ser equacionado os benefícios que “os suspeitos do costume” auferem. Convinha por variadíssimas razões, sobretudo por algumas que marcaram 2004, controlar mais as fronteiras e a forma como são transpostas. As experiências nem todas resultam bem e não é por já nos termos acostumado a elas que passam a ter carácter vitalício.
Por fim e tendo em conta o ano que se inicia, convém deixar bem patente uma ideia de fundo, que também se enraizou de forma errada e deverá ter a atenção de todos. É necessário ou aconselhável acabar com o objectivo de sermos “redondos”. O país, a sociedade e cada individuo que a compõe, tem de se definir, tem de assumir com convicção as suas ideias e deixar de viver tentando agradar a gregos e a troianos só porque dá menos trabalho ou preocupação. É necessário trabalhar em prol do bem comum, mas é ainda mais importante, assumir divergências para discutir e encontrar as convergências. Não somos todos iguais, uns têm de se mostrar de direita, outros de esquerda, uns progressistas, outros conservadores, uns ateus, outros crentes, mas acima de tudo tem de haver confrontos de ideias, eleitores informados e participação social.
Definitivamente encerrar o capítulo de que “são todos iguais, não vale a pena votar ou participar porque são todos iguais…”
Há que distinguir as diferenças, há que primar pela cultura da informação e acompanhamento da vida política. Só assim se mudará e melhorará um país. Só assim acabaremos com raízes artificiais e incompreensivelmente persistentes. Só assim os desejos para 2005 farão sentido e se sentirão nos anos seguintes!
Por JOÃO MARIA CONDEIXA
Axónios Gastos
Fonte: Notícias Alentejo
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